CONTRAPONTO
A importância da Reforma da Previdência para o desenvolvimento socioeconômico do Rio de Janeiro
Marcel Balassiano
Muito já se falou sobre a reforma da Previdência, e sua importância, sendo esse tema um dos principais no debate político e econômico nos últimos tempos. Essa reforma é complexa também porque, apesar de ser quase uma unanimidade entre os economistas a necessidade de se fazer algum tipo de reforma, envolve política, já que é necessária a sua aprovação pelo Congresso. A reforma já foi aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados, com 379 votos favoráveis e 131 contrários. Agora ainda falta passar por outras votações na Câmara antes de ir para o Senado. Além de atacar o problema fiscal (reduzir o déficit crescente), a reforma também tem o caráter de diminuir os privilégios, dadas as diferenças entre os regimes. A economia prevista com essa reforma é de mais de R$ 900 bilhões em dez anos.
Em 2018, a Previdência Social (incluindo o RGPS – Regime Geral de Previdência Social e o RPPS – Regime Próprio de Previdência Social, ou seja, funcionários da iniciativa privada e servidores públicos da União, considerando-se civis e militares) apresentou um déficit de quase R$ 280 bilhões, o equivalente a mais de 4,0% do PIB, sendo 30% desse déficit correspondente ao setor público federal e 70% do déficit do setor privado (RGPS). Só que enquanto os benefícios do setor privado foram pagos para mais de 30 milhões de pessoas (do setor urbano e rural), os benefícios do RPPS foram para pouco mais de um milhão de servidores públicos federais (civis e militares).
O déficit do RGPS foi de quase R$ 200 bilhões. Para efeitos de comparação, esse déficit cresceu 170% nos últimos dez anos, já que era pouco superior a R$ 70 bilhões (em preços de dezembro de 2018, deflacionados pelo INPC), em 2009. O déficit passou de 1,3% do PIB em 2009 para 2,9% do PIB em 2018. Isso ocorreu, pois a arrecadação líquida manteve-se praticamente estável (passou de 5,5% do PIB para 5,7%, nesses dez anos), ao passo que os benefícios pagos cresceram de 6,7% do PIB para 8,6%.
Em relação ao RGPS, pode-se analisar a diferença entre trabalhadores rurais e urbanos. O déficit dos trabalhadores urbanos corresponde a 42% do déficit do RGPS, contra 58% dos trabalhadores rurais. Isso acontece porque a arrecadação dos trabalhadores rurais é baixa (menos de R$ 10 bilhões), contra mais de R$ 120 bilhões de benefícios pagos. Dos mais de 30 milhões de beneficiários do RGPS em 2018, quase 70% eram trabalhadores urbanos, contra pouco menos de 30% de trabalhadores rurais. O déficit per capita do setor rural é mais de três vezes o déficit do setor urbano, já que no primeiro caso há um déficit de R$ 113,8 bilhões para 9,5 milhões de pessoas (R$ 1.1978,9/pessoa); no segundo caso, o déficit é de R$ 81,4 bilhões para 20,7 milhões de pessoas (R$ 3.932,4/pessoa).
Em pouco mais de 20 anos, a proporção dos benefícios previdenciários do RGPS passou de 35% da despesa total para mais de 43%, em 2018. Isso somente para pagar os aposentados do setor privado. Ainda faltam pagar os aposentados do setor público, além dos ativos do setor público (pessoal e encargos sociais correspondeu a 22% da despesa total no ano passado).
O Boletim de Finanças dos Entes Subnacionais de 2018, divulgado pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), mostra que, em 2017, o déficit da previdência dos Estados foi próximo de R$ 94 bilhões. Ou seja, se somarmos esse déficit previdenciário dos Estados com o déficit do RGPS e do RPPS, chegamos a um déficit de mais de R$ 370 bilhões, o que corresponde a 5,5% do PIB. Por isso que a reforma da Previdência é tão importante para o reequilíbrio fiscal, tanto da União quanto dos Estados.
Os três Estados com maiores déficits em 2017 foram São Paulo (R$ 21,3 bilhões), Minas Gerais (R$ 15,3 bilhões) e Rio de Janeiro (R$ 13,1 bilhões). Segundo alerta contido no relatório da STN, “tal crescimento é indício do problema da insustentabilidade dos regimes de previdência estaduais, tendo em vista o consumo cada vez maior de recursos financeiros, que poderiam estar sendo direcionados para atender e ampliar os serviços básicos exigidos pela sociedade”.
Um problema para os Estados é que a maior parte dos seus servidores é de professores e militares, classificados como “aposentadorias especiais”, já que esses profissionais se aposentam mais cedo que as demais carreiras do Executivo. As reposições desses servidores, portanto, são mais frequentes e, consequentemente, mais onerosas. Conforme o relatório, em média os professores compõem cerca de 50% dos inativos do Poder Executivo, enquanto os militares compõem cerca de 15%. Nos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Santa Catarina essa taxa é maior do que 80%. Um ponto fundamental que não está na proposta de reforma aprovada em primeiro turno na Câmara dos Deputados é sobre Estados e Municípios. Porém, há expectativas de que o Senado inclua a reforma de Estados e Municípios em uma outra PEC, o que é fundamental para a sustentabilidade fiscal desses entes da Federação, já que muitos (a maioria) apresentam problemas fiscais.
Ou seja, grande parte da despesa primária é destinada a pagar aposentados (do setor público e privado) e funcionários públicos da ativa, não sobrando muito para todo o resto. A reforma da Previdência é necessária e fundamental para o reequilíbrio das contas públicas brasileiras, já que há cinco anos (2014-2018) o país voltou a apresentar déficit primário – gastando mais do que arrecada, excluindo os juros – depois de 16 anos de superávit (1998-2013), com a dívida bruta tendo passado de pouco mais de 50% do PIB, em 2013, para quase 80% atualmente.
Resolver o desequilíbrio fiscal, da Previdência em particular, é condição preponderante para que os Estados consigam crescer mais e, com isso, gerar mais empregos. Em 2017, por exemplo, o Estado do Rio de Janeiro gastou com Previdência mais do que gastou com segurança, saúde e educação juntos. Como frisado no artigo “Economia e Governança: dupla análise sobre o atual contexto socioeconômico do Rio”, “somente com uma economia mais forte, e uma melhor governança, os outros problemas fluminenses, a segurança em especial, poderão ser resolvidos”.
É sempre importante lembrar, entretanto, que a reforma da Previdência é uma condição necessária, mas não suficiente, para uma retomada maior da economia. Com ela, o país não “continua piorando”. Porém, para ter um desenvolvimento mais pujante, e diminuir essas diferenças para os outros países, é preciso melhorar o ambiente de negócios, aumentar os investimentos, a produtividade, entre outras reformas.
CONTRAPONTO
Luana Lourenço
Ampliar os impactos econômicos sob a perspectiva social nos permite analisar com profundidade a atual conjuntura. No contexto da cidade e do estado do Rio, percebe-se o quanto questões alarmantes como a falta de segurança e o déficit da Previdência precisam avançar para gerar resultados efetivos e duradouros.
Tempestivamente cabe “levantar a bandeira vermelha” para o perigo que o Rio corre de ser ainda mais varrido para a violência, e para a necessidade de provocar reflexão acerca do impacto trazido por esse obstáculo à economia, sobretudo quando pensado no longo prazo.
A nosso ver, a área que atualmente mais necessita de investimentos é a segurança, pois sem esse fator relevante pouco se avança economicamente. No fim das contas, quem investirá em um ambiente de medo e desordem?
O carioca, e o fluminense, vive assombrado pelo medo – por todos os cantos escutamos relatos de pessoas assustadas com os efeitos da violência. De fato, é necessário perceber a extensão desse problema, encarar todos os desafios e trabalhar com afinco em prol do bem-estar e segurança da população do Rio.
Outro ponto de interseção é o impacto positivo gerado pela oclusão do “grande ralo” de saída de capital. Assim, “fechando a torneira” podemos avançar em matéria de desenvolvimento econômico e social, e otimizar os recursos escassos em favor do cidadão.
Logo, o Estado do Rio e o Brasil como um todo serão positivamente afetados pela alocação eficiente de investimentos, como bem observado pelo pesquisador Marcel Balassiano. Portanto, convém canalizar fontes de recursos para questões importantes, a saber: segurança, educação e saúde. Esse redirecionamento do capital disponível para essas áreas trará retornos satisfatórios aos fluminenses.
A economia que pode advir da reforma da Previdência nos próximos anos, principalmente se forem incluídos estados e municípios, possibilitará o aumento de verbas para segurança e educação, além de reverberar positivamente na saúde, em virtude da melhoria na qualidade de vida das pessoas.
Como visto, os efeitos produzidos por essa engrenagem certamente serão percebidos no longo prazo, visto que ampliará a possibilidade de atrair novos investimentos ao Estado do Rio, na melhoria do bem-estar do cidadão fluminense.
O Rio de Janeiro precisa superar seus desafios (Previdência deficitária e falta de segurança) para avançar na retomada de investimentos e se tornar economicamente sustentável. Portanto, caberá aos nossos governantes conduzir a cidade e o estado no caminho da boa governança, com a eficiente gestão dos recursos para garantir um fluxo econômico adequado, rumo ao desenvolvimento.
Por fim, não é exagero reforçar que a adesão do estado e do município do Rio de Janeiro à reforma da Previdência, assim como de outros entes subnacionais, compreende fator decisivo para o desenvolvimento sustentável, sob o ponto de vista econômico e social.
Avante Rio!
Marcel Balassiano - é Mestre em Economia Empresarial e Finanças (FGV EPGE), Mestre em Administração (FGV EBAPE) e Bacharel em Economia (FGV EPGE).
Luana Lourenço - Graduada em Direito pela UCSAL. LL.M em Direito Empresarial com Especialização em Compliance Avançado pela FGV Direito Rio. Cursa o Máster Profesional em Compliance na IMF Business School. Professora da Pós-graduação em Gestão de Conflitos e Mediação Familiar na Universidade Católica do Salvador. Diretora da Ocean Governança Integrada – Direcionando Empresas. Fundadora do Governança no Rio.
Parabéns pela colocação!
Obrigada, Suryan!